A Zippy, da SONAE, vai abrir uma loja em Istambul.
Em tempos idos, penso que isto deveria ser um orgulho nacional. Não tão grande quanto as “Descobertas”, mas um orgulho. No entanto, não sinto nada disso. Na verdade, tenho alguma admiração pela expansão que a SONAE conseguiu. Mas também sei que não se consegue o que conseguiu a SONAE sem que alguém perdesse com isso. Trabalhadores, fornecedores, clientes. Claro que nos “Descobrimentos” encontramos uma história semelhante, mas eles já estão lá longe e fica essencialmente o orgulho da coisa… esquecemos, por exemplo, que as caravelas que vinham da Índia já tinham a totalidade da mercadoria empenhada a agiotas que tinham emprestado dinheiro para o empreendimento e que nem do país tinham saído, que isso de ir à Índia dá muito trabalho… e olhem que eu percebo que os empréstimos têm de ser remunerados! Só que acho que tem de haver um limite que não arruíne os que têm de sujar as mãos.
Mas falava dos dias de hoje. Quando as grandes superfícies tomam conta da maioria do comércio, os produtores de leite, de legumes, do que seja, não têm muito mais a quem vender... aí, é fácil aos distribuidores baixar os preços, arruinando os produtores. Uma boa parte dos produtores de leite do norte fechou portas ou converteu-se à suinicultura por receber apenas 30 cêntimos por litro de leite, pagando 35 cêntimos por quilo de ração.
Uma vaca produz em média 25 litros de leite por dia (7,5€) e consome em média 7 kg de ração (2,45€). Cerca de 5€ de lucro por dia por vaca. Se considerarmos todos os restantes custos… mais vale ir pescar para o Kiribati…
Notícia de há meses notificava que só em Mogadouro e Miranda do Douro fecharam 16 explorações de leite em 2010. Começaremos a ficar dependentes do exterior até na produção de leite?
5 comentários:
Não me tenho dedicado a análises tão aprofundadas como as tuas, mas também estou bastante preocupado com o efeito «hipermercados». Depois de ter decidido deixar de comprar lá batatas — pela simples razão de que estão na maioria das vezes a meio-caminho da podridão, além de nunca terem tido sabor a batata – comecei a comprá-las ao dobro e ao triplo do preço a agricultores à beira da estrada. Desde que se possa (e como mais cereais que batatas), valia até a pena pagar quatro ou cinco vezes mais. Entretanto, deve ter terminado a época, porque nos últimos dois dias andei à procura de batatas em redor de Mafra e não vi ninguém a vendê-las. Procurei então o pequeno comércio local, que na verdade não costumava frequentar porque a higiene deixava muito a desejar. Apercebi-me que muitas das pequenas mercearias e lugares de fruta que existiam na zona já fecharam. Por fim lá encontrei um, comprei as batatas e mais umas coisas (tudo ao dobro dos preços dos hipers), e os vegetais eram óptimos.
Os hipers estrangulam os produtores, no leite e em tudo. Ouvi há dias que muitas vezes obrigam esses fornecedores a prescindirem da cobrança do IVA facturado, embora tenham de o entregar ao Estado e os hipers o deduzam nas suas contas (a Univ. de Coimbra fez-me isso uma vez, no único serviço que prestei ao Estado como independente), armazenam em massa e abusando do frio, o que tem um efeito deletérios nos alimentos; e a alardeada criação de emprego é ridícula se comparada com o que fazem perder no pequeno comércio e empobrecem na agro-pecuária. O LIDL tem lojas que não devem andar longe dos 1000 metros quadrados aparentemente com duas pessoas a trabalhar de cada vez.
E assim está a quase totalidade de um país — consumidores, produtores, trabalhadores — sob a chantagem de meia dúzia de Belmiros e Alexandres Santos. É altura de começar a organizar um boicote.
Olá Manuel! É uma análise que decorre em parte do meu trabalho. As notícias dos jornais económicos abordam o tema de um modo mais profundo do que os jornais não económicos, que são menos específicos. Dizem que os agricultores estão a fechar portas. Que é a crise. E pouco mais.
A Lurdes compra boa parte dos vegetais numa cooperativa, que em parte é produtora. Mas há por aqui por Sintra pequenos produtores que vendem os seus produtos directamente ao consumidor. Apesar de os hipermercados me serem úteis, vejo-os com desconfiança e não compro lá tudo. Mas reconheço que a maioria da população vê neles a utilidade de ter tudo à mão e mais barato. O mais barato significa tudo o referido acima mas também a importação de produtos de sítios onde o diabo perdeu as botas. Há uns dias comprei, num hiper, gengibre vindo da China (cá não deve haver...). Deve ter gasto o equivalente em peso em combustível para cá chegar... mas em compensação deverá ser mais barato para o Belmiro.
Boicote. E vamos lá convencer alguém num boicote a produtos baratos em tempo de crise... uma boa ideia, mas acho que não conseguiria convencer ninguém. Nem consegui convencer ninguém a formar um partido. Imagino que não o conseguiria fazer em relação à compra a produtores locais, em princípio mais caros :P
Não conseguiste convencer alguém a formar um partido? Estranho! Com a falta que há deles e com os benefícios que dão...
Está tudo nas mãos dos especuladores e o Estado regulador apenas cria gabinetes para dar emprego a meia dúzia de boys e quando é confrontado com as vigarices limita-se à desculpa da falta de meios ou das leis.
Assim está o Mundo. O poder económico é que dita as leis e os políticos são meros fantoches, pagos para sugarem aos mais necessitados e entregar aos tubarões.
Isto um dia vai mudar. Tem que mudar. Mas até que o ciclo se feche, vamos ter de passar muita miséria. Quando o povo tiver realmente fome, não venham para cá com ameaças veladas, porque os tumultos vão ser a sério.
Olá Fresco! Isto tem de mudar. Mas só muda quando nós mudarmos... a economia doente é sintoma de uma sociedade doente. De uma sociedade que quer liberdade apenas para gritar por direitos mas que se esquece dos deveres. Que luta pelo primor da sua saúde mas que prefere fazer abortos a tomar a pílula. Que quer escolaridade mas que quer avaliações fáceis... isto tem de mudar, sim. Estou completamente de acordo. Mas penso que só mude quando nós próprios mudemos... temos os políticos que geramos, parecidos com muitos de nós... os que sejam melhores têm de avançar. De tomar lugar nas movimentos e partidos. E melhorá-los por dentro.
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